BNDS: Banco Estatal e a cadeia produtiva predatória da Pecuária

Carla Makley
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Um fenômeno natural que já atraiu gente do mundo inteiro para o Norte do Brasil acabou, não existe mais: o encontro de águas do rio Araguari com o Oceano Atlântico. O rio Araguari nasce no norte do Amapá e corta sete municípios até a costa leste do estado. Ficou famoso por causa da pororoca, o fenômeno natural produzido pelo encontro das correntes fluviais com a maré do Oceano Atlântico. Antes rio e mar se confrontavam, criando uma onda que percorria mais de dez quilômetros. Surfistas e naturalistas de todo o mundo desembarcavam no Amapá em busca da onda perfeita. Hoje, apenas lâminas d’água cobrem o leito quase todo à mostra.

O motivo? Segundo pesquisadores, a atividade pecuária extensiva , principalmente a criação de búfalos, criou valas e canais que drenaram o curso d’água. O fim da pororoca dificultou também o acesso para os ribeirinhos. A partir de um determinado ponto, nenhum tipo de embarcação, por menor que seja, passa mais. Antes, a profundidade do rio era de quase seis metros. A foz do rio, onde ele desaguava e se encontrava com o Oceano Atlântico, formando a pororoca, fica a 20 quilômetros de lá. Todo esse percurso era navegável. Agora, a vegetação está começando a cercar a área.

Este é apenas um dos exemplos predatórios do que a exploração dos recursos naturais pela atividade pecuária está ocasionando ao meio ambiente. Pesquisas realizadas pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) e pela Agência Alemã para a Cooperação Internacional (GIZ) mostraram que para cada R$1 milhão faturado pela pecuária, R$22 milhões são gerados de impactos ambientais. E mais: a pecuária é responsável ainda por 90% do desmatamento da Amazônia, por pelo menos 50% de toda água doce consumida e pela poluição de rios e pelo processo de degradação e desertificação do solo.

Mas como as entidades reguladoras permitem que isso continue? Como segundo maior acionista de um dos maiores frigoríficos do país, o governo vê na pecuária a oportunidade para arrecadar rapidamente verba para cobrir os rombos feitos nos cofres públicos dos últimos anos. Levantamentos realizados pela Bloomberg e El Pais apontam que em 2013 a JBS possuía uma dívida no mercado de aproximadamente 23,748 bilhões de reais, o que representava 102,7% de sua capitalização em bolsa. Hoje, seu faturamento anual é de 92,9 bilhões de reais. O segredo para esse sucesso não é nenhuma fórmula mágica, nem tão pouco fruto de muito trabalho. O Estado brasileiro, por meio de empréstimos do BNDS , é o credor de grande parte dessa dívida, o que respaldou o crescimento da empresa e transformou, por sua vez, o governo no segundo maior acionista da empresa.

Por isso, os frigoríficos no Brasil podem desmatar o que bem entenderem, mudar cursos de rios, emitir muito gás carbônico para a atmosfera. Não importa o estrago feito na natureza, desde que o faturamento continue alto. E se engana quem acha que esta é uma matéria tendenciosa, contra o consumo de carnes. Não. Apenas achamos que este setor deveria ser fiscalizado a partir de normas e critérios como diversos outros que são inspecionados por órgãos reguladores. O cuidado com o meio ambiente deveria ser prioridade de todos e as leis aplicadas sem exceção. Lamentável que as prioridades do governo de um país estejam tão aquém de suas reais responsabilidades.